Madrugada.
Trezentos homens atrás de uma colina. Mais trezentos atrás dos
muros fortificados. Três sargentos discutindo táticas.
- Temos
aríetes e escadas - Elesehr Bjorn, o sargento da tropa de arqueiros,
notificou.
- As
escadas são dispensáveis, perderemos muito tempo e homens caso
tentemos invadir por cima do muro. Precisamos derrubar o portão
principal e invadir a cidadela com todas as nossas forças- Galwin
Snow respondeu.
- Lá
dentro, eles não terão a menor chances - Lothar, o bárbaro, estava
ansioso.
- Nós
não teremos chances se eles nos enfraquecerem antes de entrarmos.
Minha unidade irá na frente em formação de tartaruga e um aríete.
-
Formação o quê? - O bárbaro pareceu confuso.
- Escudos
levantados sobre as cabeças dos soldados - o Bjorn esclareceu.
-
Elesehr, você vai me dar cobertura. Garanta que qualquer homem que
apareça nos muros receba uma flecha na garganta. Lothar, sua unidade
virá logo após a minha, eu irei derrubar o portão e abrirei
caminho para você entrar em carga. Todos entraremos na cidade,
Lothar, eu e Elesehr, nessa ordem. Todos de acordo?
Elesehr
estalou a língua.
-
Perderemos muito homens, mas temos chances.
- É o
que temos, sabíamos que estávamos em desvantagem desde o começo.
Eles ainda não nos detectaram, teremos que atacá-los sem dar tempo
de se organizarem para equilibrar as chances. Alguma sugestão
melhor?
Ninguém
se manifestou.
- Então,
vamos. Minhas tropas marcharão dentro de dez minutos. Estejam
preparados.
A cota de
malha pesava sob os ombros do sargento bastardo. As botas eram lama
pura. O escudo de metal parecia inadequado na mão direita para a
maioria do guerreiros. A espada bastarda simplesmente fazia parte da
mão esquerda.
- Homens!
- Galwin mobilizou sua tropa. - Temos uma missão nesta noite! Iremos
derrubar o portão e, depois, derrubar o invasor! Todos teremos as
espadas sujas ao amanhecer e todos teremos bebidas e mulheres na
próxima noite! Vamos! Vamos para nossa conquista! - e um urro se fez
na noite. O sargento marchou e foi seguido por sua tropa.
Galwin
não tentou ser discreto e nem conseguiria. Sua unidade estava a
cerca de dois quilômetros de distância num terreno plano e de
vegetação rasteira. Depois de dez minutos, tochas se agitaram de um
lado para o outro no muro. Em vinte, uma meia dúzia de homens
apareceram com arcos. Em trinta, mais alguns poucos surgiram e os
soldados estavam a menos de cinquenta metros do portão.
-
Formação tartaruga! - ordenou e foi obedecido.
Logo,
flechas assobiaram pelo ar e encontraram o casco de escudos. Mesmo
sem enxergar os homens atrás de si, Galwin percebia como eram
inexperientes. Todos com os escudos erguidos sobre as cabeças, mas
conforme andavam e se cansavam, iam esbarrando uns nos outros,
empurrando e abrindo brechas para as setas matarem os incompetentes.
Flechas encravaram nos escudos na primeira saraivada sem causar
nenhum estrago, mas um gemido agonizante pôde ser ouvido na segunda
. Quando chegaram ao portão, a segunda ordem foi dada.
- Abrir
caminho para o aríete!
A maioria
não ouviu, mas seguiram o exemplo dos homens das primeiras fileiras
e abriram o corredor.
E a tora
de madeira maciça veio com fúria contra o portão.
Logo no
primeiro impacto, a madeira estalou e rachou. Nesse momento, pedras
caíram do céu acompanhando as flechas. O sargento sentiu uma batida
forte em seu escudo e quase deu um soco na minha própria cabeça,
mas manteve a posição firme. Ele pôde ver um de seus homens
distraídos observando o aríete receber um pedregulho no pescoço e
cair esparramado no chão com a cabeça num ângulo disforme.
-
Protejam o aríete! - Galwin gritou para evitar que matassem os
homens encarregados da principal missão e para garantir a
concentração dos demais. A defesa era precária, mas relevante.
O segundo
impacto foi ainda mais intenso e espalhou rachaduras e brechas por
toda madeira inimiga. A ponta de uma flecha perfurou o escudo do
sargento e não atingiu seu antebraço por centímetros. Um cadáver
despencou do muro com uma flecha na barriga e matou ridiculamente um
dos homens do aríete, que foi prontamente substituído por outro
entusiasta vibrante - a visão de dois corpos um em cima do outro era
risível.
O
terceiro impacto foi decisivo. Uma cratera enorme inutilizou a
barreira e abriu caminho para a invasão. Os homens de fora gritavam
em vitória precipitada. Os homens de dentro se mantinham firmes em
suas posições.
- Abrir
caminho para a tropa aliada!
As
flechas e pedras pararam de cair. Agora, os inimigos se focavam na
proteção interna e realmente precisavam de todos. A tropa de Galwin
abriu caminho e logo a tropa de Lothar veio. Mais parecia uma turba
bárbara como o sargento do que realmente uma unidade militar. Eles
correram e entraram com as armas erguidas para o ataque e o bastardo
torceu para que eles fizessem tanto estrago quanto barulho.
Enquanto
a tropa do bárbaro avançava na vanguarda, o bastardo reorganizou a
sua. Gritou, ordenou que os comandos fossem repassados, mas sabia que
era impossível ter uma formação perfeita naquele momento -
infelizmente, teria que contar com a inteligência da maioria. Enfim,
deu-se por satisfeito e marchou para dentro da cidadela.
Não
demorou para Lothar se mostrar imprudente. O capitão inimigo havia
posicionado duas tropas na frente do combate e sua própria tropa na
retaguarda. O bárbaro simplesmente investiu para o meio do campo de
batalha e agora tinha sua tropa cercada pelas duas outras - e não
demoraria para ter seus homens dizimados.
Galwin
movimentou seus homens para o flanco esquerdo, pegando uma das tropas
adversárias pela retaguarda.
Havia
chegado sua tão esperada hora de derramar sangue.
Os
soldados inimigos viram a chegada da tropa do bastardo, mas não
souberam como reagir. Nem todos os homens combatem ao mesmo tempo,
muitos ficam na retaguarda esperando sua hora de atacar e eram
justamente esses quem o sargento mirava. Sendo assim, eles tinham a
ordem de atacar um adversário, mas estavam vendo outro se aproximar
e seu líder estava muito ocupado para perceber a aproximação e dar
as ordens apropriadas - diversão garantida para o atacante. Com o
escudo erguido, Galwin espetou a costela do primeiro inimigo, que
caiu na mesma hora. Deu um passo, abriu um estômago e derrubou mais
um. Outro passo, outra barriga vazando, outro corpo no chão. Com um
bom avanço, parou e comandou antes que sua tropa perdesse a unidade
e virasse uma bagunça.
- Manter
posição! Manter posição!
Um
soldado veio contra Galwin com a espada erguida num movimento
completamente óbvio que encontrou o escudo e foi morto com a lâmina
em seu tórax.
-
Proteger o flanco - alguém gritou. Não foi possível ver quem, mas
com certeza era um sargento em potencial, alguém que percebe uma
necessidade de liderança e toma a dianteira. Alguém que precisava
morrer.
A tropa
do bastardo manteve uma formação aceitável e ele ordenou que
voltassem a avançar. O nível de disciplina e treinamento da sua
tropa e da inimiga era o mesmo: homens jovens, ansiosos e
inexperientes. Mas ele estava atacando o flanco e não o fronte, ou
seja, homens que não receberam ordem nenhuma, não tinham certeza do
que fazer e, o pior, não tinham uma voz que comandasse, cada um
tomava decisões diferentes, enfraquecendo a unidade. O desfecho
daquela noite era incerto, mas aquela tropa estava fadada.
Galwin
derrubou mais alguns adversários até encontrar o aspirante a
sargento, garantir ter o seu cadáver no chão e pode seguir matando
sem mais problemas. O sargento inimigo só se deu conta que estava
sendo cercado quando metade da sua tropa já havia sido eliminada.
Lothar surpreendeu mantendo metade dos seus homens vivos até aquele
momento. Elesehr estava dando um suporte significativo com seus
arqueiros e evitando que a tropa do bárbaro fosse morta.
Homens
caíram e foram pisoteados por todos os lados e o bastardo garantiu
que a maioria fosse do lado contrário ao seu. Lothar aproveitou o
reforço, matou o sargento e agilizou o fim daquela tropa. O ideal
seria juntar as duas tropas e terminar com a outra unidade inimiga
Mas a
guarda pessoal do capitão Blacktide avançou contra Galwin.
-
Barreira de escudos! - o bastardo berrou.
E as
tropas se chocaram.
O
sargento não sabia o nome do herdeiro vassalo dos Greyjoy, mas sabia
que era ele que estava a sua frente. Ele pretendia usar sua tropa
descansada contra a que já estava avariada e isso poderia significar
o fim de Galwin - por mais que Lothar derrotasse a outra tropa, não
sobrariam homens o suficiente para um reforço significativo e as
flechas de Elesehr também não seriam um grande diferencial.
Só havia
uma maneira de vencer aquela batalha.
-
Desfazer formação! Atacar! Atacar a vontade! Matem todos! - Snow
comandou e um urro de empolgação ignorante veio em seguida. O jovem
Blacktide olhou incrédulo.
- Acabou
de garantir a sua derrota.
- Não,
acabei de garantir a sua.
Não
havia chances de derrotar toda a tropa inimiga, mas havia chances de
derrotar um único homem: o líder.
E o
bastardo avançou e atacou. Seu primeiro golpe foi aparado pela
espada inimiga, o segundo encontrou o escudo e o terceiro assobiou no
ar. O Blacktide contra-atacou com seu escudo para abrir a guarda,
empurrando Galwin um passo para trás e estocou, mas seu golpe foi
evitado com a espada e a ofensiva foi retomada. O sargento forçou
que seu inimigo recuasse um passo com um ataque impetuoso, outro com
um encontrão de escudos e um terceiro ataque foi tentado, mas o
nobre se concentrou na defesa e impediu qualquer avanço. Revirando o
jogo, o Blacktide girou a espada na horizontal violentamente,
esperando uma esquiva, mas Snow bloqueou com o escudo, mesmo quase se
desequilibrando com o impacto. O inimigo aproveitou para atacar e era
justamente o que Galwin queria - ele não se distraiu com o bloqueio,
pelo contrário, prendeu a atenção do adversário para onde ele
queria. A espada do herdeiro veio, o bastardo esquivou pela direita e
desceu seu escudo no tornozelo do jovem herdeiro Blacktide. Um estalo
doloroso se fez ouvir, seu rosto se desconfigurou em dor e seu corpo
foi ao chão.
- Você
conseguiu... - ele gemeu. - A vitória é sua... Sou seu prisioneiro.
- Eu não
vim fazer prisioneiros.
A mão
direita de Galwin encontrou o cabelo do herdeiro Blacktide e a lâmina
encontrou sua garganta.
- O
capitão Blacktide está morto! - o sargento bastardo urrou e todos
os soldados aliados responderam em comemoração.
Alguns
inimigos fugiram, outros se renderam, mas a maioria foi morta - Snow
não aceitou nenhuma rendição e nem Lothar se apiedou de seus
derrotados.
A euforia
foi imensa e parecia inacabável. O combate foi dentro da cidadela,
entre as casas, mas nenhum cidadão foi visto. Provavelmente, a
maioria das família fugira para longe durante a madrugada antes da chegada das tropas, mas ninguém apareceu nem ao longe mesmo
depois da vitória - quem estava perto provavelmente ainda estava com
medo e escondido pelos casebres. Os homens queriam bebidas e
mulheres, mas aquilo não era um saque e Galwin teve que detê-los.
Prometeu mil recompensas para vários e até deu bronca em alguns,
mas manteve o controle. Quando os nervos estavam menos exaltados,
todos marcharam até o casarão dos Dorgauld.
Os servos
dos Blacktide que guardavam a residência já haviam se rendido,
todos desarmados e inofensivos como gado quando Galwin, Lothar e
Eleserh chegaram. O sargento Snow permitiu que aqueles vivessem.
Os
Dorgauld os receberam cheios de agradecimentos. Prometeram honrarias
e presentes aos "salvadores". O povo os saudaria e um
banquete seria realizado.
Eram
heróis.
E o
bastardo retornaria para seu tio de queixo erguido e teria sua maior
recompensa: a aprovação de sor Arthur Bjorn e o ódio dos demais
vassalos.
Mas, por
hora, brindaria a vitória com seus comandados. Com sua própria
tropa.